quinta-feira, 20 de outubro de 2016

O Alcance da Disrupção Digital

Se a necessidade é a mãe da invenção, a destruição criativa é sua parteira. São inúmeras as atividades econômicas que caíram em desuso ou simplesmente desapareceram: A economia em torno da indústria baleeira praticamente desapareceu com o advento da lâmpada elétrica, carroceiros foram obrigados a se adaptar e produzir carrocerias para a nova indústria automobilística enquanto criadores de cavalos tornaram-se provedores de artigos de luxo. A indústria do petróleo começa a sofrer ataques das “energias limpas” graças a todo um contexto desfavorável de mudança climática global.
Indústrias tradicionais, como a hoteleira, acusam o golpe de novatos no mercado, como o Airbnb e sindicatos de taxis já desenvolvem seus próprios aplicativos e serviços para concorrer com Über e Cabify. Logo os planos de saúde descobrirão, tarde demais, que o Dokter é, sim, um concorrente à altura enquanto novos NuBanks continuarão a atormentar a vida dos bancos tradicionais.
Vemos pela história que a destruição, seja por extinção ou por transformação radical, de uma indústria é o meio pelo qual novos serviços se tornam fundação para novos mercados e novas indústrias. Impensáveis, até então.  Uma análise superficial do Über serve para ilustrar a diferença:
Se um empresário quisesse, no final do século XX, implantar um serviço de transporte capaz de concorrer com o já estabelecido Taxi urbano, precisaria se preparar para uma verdadeira operação de guerra. Da seleção da frota ao treinamento dos motoristas passando por toda a logística de manutenção e abastecimento dos veículos, cada passo do estabelecimento do negócio seria um pesadelo regulatório e comercial. Tentar criar um serviço privado que abrangesse uma cidade média apresentaria custos que inviabilizariam o retorno desse nascente negócio. Isso sem falar na possibilidade dos potenciais clientes rejeitarem os veículos e o serviço. O prejuízo seria imenso.
Mas este cenário deixou de existir com os novos empreendedores digitais.
Em março de 2009 Travis Kalanick fundou a Über. Em 2016, 7 anos após sua fundação, a Über já vale US$ 51 bilhões e administra a maior frota de veículos de transporte de passageiros do mundo, globalmente, sem ter um único automóvel próprio. Em 7 anos, a Über conseguiu iniciar o processo de destruição de uma das indústrias mais tradicionais das áreas urbanas: o transporte individual de passageiros. Um negócio que há 20 anos seria impensável para ser implantado em uma única cidade pequena é hoje um produto global, gerando inovação e disputas decorrentes do processo de destruição criativa.
Em outro exemplo, esse de maio de 2013, uma empresa de pagamentos lança um produto revolucionário no mercado, um cartão de crédito sem papel, com atendimento “descolado”, dando ao cliente a possibilidade de gerenciar sua conta como se fosse uma conta bancária. E tudo isso sem tarifas. O NuBank é hoje uma referência da indústria financeira que vale mais de US$ 500 milhões sem ser um banco.
A disrupção de um setor ocorre quando novos serviços conseguem ser ofertados, de forma conveniente, a consumidores que não reconhecem vantagem no serviço ou produto atual. Creio que a palavra chave aqui é conveniente. Não é apenas uma questão do preço ser justo ou do serviço ou produto ser de qualidade. Mais que qualquer outro requisito, há que ser conveniente.
Pense em alguém que precisa de um cartão de crédito. Além de ter que ir a sua agência bancária ou ligar para um 0800 e ter que assinar um ou mais formulários para depois  esperar o cartão chegar pelo correio, ou, dependendo do banco, ir buscá-lo na agência onde tem conta. O que fez o NuBank? Tornou-se conveniente. Mais que ser um cartão sem tarifas, qualquer pessoa pode solicitar um cartão internacional bastando para isso baixar um aplicativo no celular e seguir as instruções. Junte isso a um desejo de maior modernidade e o produto cartão de crédito oferecido pelo NuBank torna-se extremamente conveniente. A novidade foi o processo de originação de um produto financeiro.
Disruptivo foi o processo, não o produto.
E é, na rápida modificação de processos para oferecer produtos e serviços que chegamos ao ponto máximo da disrupção digital. Quanto custa a um entrante no mercado oferecer um serviço pela Internet? Quanto custa modificar o processo caso a primeira tentativa não dê certo? Quantas vezes esse processo poderá ser alterado até que se chegue ao ponto ótimo para os potenciais clientes? Como captar a satisfação dos clientes para continuar a melhorar o produto? E quais as respostas para os atuais fornecedores de produtos e serviços?
Quando vemos a história da Über e vemos a quantidade de modificações feitas ao produto ao longo do tempo até o lançamento público da companhia, e que continuam sendo feitas,  para garantir clientes satisfeitos e um produto em constante evolução, vemos que não foram as barreiras de entrada que caíram no mundo digital: a verdade é que ficou muito barato falhar e recomeçar.
Essa nova geração de empreendedores digitais não é nem mais nem menos criativa que as anteriores. A nova geração também não é mais tolerante a riscos. Os riscos é que ficaram menores.